segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Cilindrada não é potência



Honda CG 150 Titan, Ducati 748, Kawasaki Ninja 636, Suzuki GSX-R 1000 são nomes de alguns modelos conhecidos. Com o objetivo de atrair o consumidor, os fabricantes destacam a capacidade cúbica (cilindrada) do motor no nome do modelo de seus produtos. Essa estratégia acabou provocando até confusão entre os motociclistas, associando o valor descrito como cilindrada à potência do motor. A Agrale chegou até a se beneficiar dessa tendência, ao batizar suas motos com a potência e não a cilindrada. Por isso a top de linha recebeu o nome de Elefantré 30.0 (que tinha 30 cv), mas não aparece os 200cc de cilindrada, justamente para não parecer menor que as concorrentes da época como Honda XLX 250R e XLX 350R. Muitos acreditam que um motor de maior cilindrada sempre tem maior desempenho. Na realidade, nem sempre é isso que acontece. A potência e conseqüentemente o desempenho não são obrigatoriamente proporcionais à cilindrada. A cilindrada é o volume deslocado pelos pistões do motor durante o curso, desde seu ponto mais alto (Ponto Morto Superior) até o mais baixo (ponto Morto Inferior).

Podemos citar como exemplos, a Suzuki GSX-R 1000 e a Suzuki Bandit 1200, dois modelos bem conhecidos. Apesar de ter maior capacidade cúbica (cilindrada), a Bandit desenvolve 98 cavalos de potência máxima, enquanto o da GSX-R 1000 tem 178 cv. Outro exemplo de resultados diferentes para motores de mesma cilindrada pode ser o motor da Yamaha XT 660 (48 cv) e o da Suzuki Bandit 650 (78 cv). Nesse caso o motor da Suzuki leva vantagem com relação ao da Yamaha. Outro exemplo comum, conhecido e pauta de muita confusão, é da Yamaha RD 350 e Honda CB 450, motos com “tamanho” de motores diferentes, e construção conceitualmente diverso, onde o motor da RD 350 é de dois tempos, e o da CB 450 é de quatro tempos. Mesmo com motor “menor” a RD desenvolvia 55 cv contra 43 CV do motor “maior” da 450. Neste caso a diferença de potência ocorre principalmente pelo tipo de construção do motor. O motor com ciclo de dois tempos aspira nova mistura de ar/gasolina a cada volta do virabrequim, enquanto o de quatro tempos necessita de duas voltas. Portanto, o motor de dois tempos não tem perda de potência para girar uma volta adicional do virabrequim como ocorre no motor quatro tempos. 

A potência, no entanto, não é o dobro como poderia se supor. No exemplo das 650, apesar dos dois motores serem de quatro tempos, as potências variam de 78 cv a 10.100 rpm para a Bandit 650 e 48 cv a 6.000 rpm para a Yamaha XT 660Z. A diferença começa no tipo de utilização proposto para os dois modelos. A Bandit 650 tem características de uma estradeira, feita para ser pilotada esportivamente, alcançando velocidades de até 200 km/h. Já a Yamaha XT 660Z foi projetada para o uso fora de estrada, com torque concentrado em baixa rotação e potência mais gradual, capaz de vencer obstáculos e subidas íngremes sem vacilar. Para alcançar altas rotações, o motor da Bandit foi projetado com quatro cilindros com curso dos pistões reduzido. Cada cilindro tem deslocamento volumétrico de aproximadamente exatos 164 cc que multiplicado pela quantidade de cilindros resulta nos 656 cc do motor.,

Quanto maior o número de cilindros, menores podem ser as massas dos pistões e suas bielas, reduzindo a inércia do conjunto. A velocidade de entrada da mistura ar/combustível fica otimizada em rotações mais elevadas, aumentando a potência do motor em altas rotações. No caso da XT 660, utiliza-se um motor de um único cilindro, com volume deslocado de 659cc, até “maior” do que o motor de quatro cilindros da Bandit. Devido às maiores dimensões do conjunto pistão, biela, câmara de combustão e suas válvulas de admissão e escapamento, a otimização da velocidade de entrada da mistura ar/combustível ocorre em rotações mais baixas. Obtém-se assim um motor com grande torque e potência em baixas rotações, facilitando sua pilotagem no fora de estrada sem tanta necessidade de troca de marchas. Isso tudo não significa que a cilindrada não tenha relação com a potência do motor. É claro que quanto maior o deslocamento volumétrico do motor, maior será a quantidade de mistura de combustível admitida e maior será a potência do motor. Portanto um “veneno” básico para melhorar o desempenho de um motor é aumentar sua cilindrada. Como exemplo, o aumento de cilindrada de uma CG 125 Fan com motor OHV (comando no bloco) para 150 cm3 (aumento de 20%), sem outras alterações, não vai fazer a potência subir os mesmos 20% pulando dos 12,5 CV para 15 CV. Detalhes como tipo de comando de válvulas, escapamento, carburação, entre outros, devem ser também alterados para que seja mantida a mesma potência específica de 100 cv por litro existente no motor original da CG 125 Fan. A família CG de 150 cc OHC recebeu mudanças na ignição, comando de válvulas e alimentação para a potência subir na mesma proporção da cilindrada. CG com 100 cv A potência específica é o resultado da divisão da potência máxima pela cilindrada, em litros. No caso do único cilindro da CG 125, a potência de 12,5 cv, dividida pela cilindrada de 0,125 litro, tem como potência específica 100 cv por litro. Sob esse aspecto, é um dos motores de moto popular com maior rendimento específico. 

Em termos comparativos, o novo VW Fox rende 71 cv (a gasolina) para 1 litro de cilindrada, o que corresponde a 71 cv por litro. Já entre as motos, a Suzuki GSX-R 1000, com 1,0 litro e 178 cv, tem 178 cv por litro, ficando entre as maiores valores de potência específica entre os motores, seja de carro ou de moto, produzidos em série. E como explicar que motos com motores semelhantes tenham potência tão díspares? O exemplo citado é das Suzuki GSX-R 1000 e Bandit 1200. Mais uma vez, o volume é apenas uma referência pois são motos para usos muito diferentes, apesar de uma construção que obedece a mesma configuração de quatro cilindros em linha e 16 válvulas. No caso da Bandit, o uso é estradeiro, que requer regimes de rotação intermediários e conforto de rodagem, pois será usada essencialmente em estradas. A potência de 98 cv surge a 8.500 rpm, enquanto na esportiva GSX-R a potência aparece na plenitude a 11.000 rpm. Um dos elementos determinantes para gerar potência é rotação. Quanto mais voltas o virabrequim der, mais detonações vai gerar, mais energia e liberação de potência. Um motor de Fórmula 1 com apenas 2,4 litros atinge 18.000 rpm e libera 700 cv (291 cv/litro)! Além disso, a construção do motor esportivo leva em conta materiais mais leves, (menor peso = mais rotação), parâmetros de alimentação que privilegiam a potência e não o consumo, torque em alta rotação, entre outras características. Basta parar ao lado da Bandit e da GSX-R para ficar óbvio que são motos para fins muito diferentes e que a “cilindrada” serve apenas de identificação. É como um poodle de madame que recebe o nome assustador de “Matador”.




Texto: Geraldo Tite Simões

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